segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014




Entrevista com o Prof. Dr. Gazy Andraus, doutor pela USP, sobre os processos de cognição através da Leitura de HQs...
No mais, Gazy Andraus é conectado ao grupo Quadro-a-Quadro.

(quadro-a-quadro.blog.br)

A Quadro-a-Quadro edita os quadrinhos do grupo Ozadia... sim! A mesma editora que publica no Brasil os quadrinhos de Ivo Milazzo, um quadrinista"notoriamente renomado"  ─O Aurélio define: "Redundância de termos, que em certos casos é legítima, por conferir à expressão mais vigor, ou clareza."... portanto, vale a pena o pleonasmo!
Bem... esse quadrinista italiano ficou conhecido por seus personagens Cults: Ken Parker (baseado em outro personagem, Jeremiah Johnson, que foi representado por Robert RedFord nos tempos dourados dos bang-bangs) e mais recentemente Tiki, O Menino Guerreiro, personagem criado exclusivamente para os fans de quadrinhos brasileiros (veja mais sobre ambos na postagem de quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014).


Segue agora a entrevista com o professor!
 


Olá! Meu nome é Juliano, sou estudante do curso de Letras, Tecnologias da Edição, do Cefet-Mg.
 

Há uma matéria publicada pelo senhor na Revista Língua Portuguesa Conhecimento Prático:  você acha possível que haja leitores hábeis de quadrinhos do mesmo modo que existem aqueles que são super hábeis com a leitura? 




Prof.Dr. Gazy Andraus

É um texto que refiz com base em um trabalho acadêmico que realizei para uma das disciplinas do meu doutorado, isso lá por 2003. Porém, ainda tive que resumir e refazer algumas partes (meu artigo original tinha mais de 70 pg), conseguindo desmembrá-lo em duas partes (aguarde que a segunda sairá lá por abril, creio). Respondendo à sua pergunta, creio que qualquer habilidade pode ser mais bem desenvolvida, e se aprendida o quanto antes, o cérebro se aprimora. Ou seja, uma criança, ao ler quadrinhos, consegue que sua mente tenha uma desenvoltura mais sistêmica ao ler a narrativa desenhada nos quadrinhos de uma página: por estas trazerem desenhos (aliados aos textos) sequenciados, faz com que a visão periférica do leitor esquadrinhe todos os quadrinhos da página simultaneamente, sejam os que foram lidos e os que serão a seguir ao foco de sua visão central que esteja mirada num quadrinho no momento presente de sua leitura. Já ouvi de alguns adultos que nunca leram quadrinhos que têm dificuldade de lê-los, pois não sabem se deve começar a ler pelos desenhos ou pelos textos: ou seja, como a mente deles não se “acostumou” com a leitura “quântica” dos quadrinhos, tal habilidade ficou prejudicada nesse (novo) desenvolvimento que teria ao ler as páginas duma HQ. Assim, reclamam de certa forma, que têm dificuldades em ler HQs.

Juliano, pelo seu questionamento, o hábito de leitura faz com que muitos se tornem super hábeis (vc se referia à leitura da literatura estritamente escrita?). Então, eu diria que o mesmo pode haver com leitores de quadrinhos: quanto antes começarem a ler, e os mais variados quadrinhos de distintos autores e de vários países, devido à riqueza criativa nas possibilidades dessa linguagem, mais acurados serão ao ler HQs. E daí eu diria que pode haver leitores de quadrinhos bem mais hábeis (que leem Turma da Mônica, S-Heróis, europeus, mangás etc) que outros (que leem só um tipo, por exemplo, Turma da Mônica) e se o leitor lê livros e também quadrinhos, melhor ainda. Mas essa minha resposta quanto a leitores de HQs mais hábeis que outros que leem menos HQs, supus com base nas informações que você me deu, aliados ao que lembro o que pesquisei em minha tese, de que a mente é neuroplástica e por isso, se configura e se expande com estímulos, quantos mais, os forem.

Por coincidência, recentemente acessei matéria sobre um pesquisador norte-americano, o Dr. Neil Cohn, em que trabalhou a questão cognitiva da leitura de HQs, cujas respostas se assemelham à leitura de uma frase (ele usou eletroencefalograma, creio, para medições).


Na minha tese, que foi pioneira, eu não trabalhei essa parte prática científica, embora tenha lido muito e feito paralelos com trabalhos que usaram os métodos de tomografia computadorizada para medirem como o cérebro reagia às leituras de textos ou imagens (o hemisfério direito reagia a desenhos e ideogramas e o esquerdo mais às escritas fonéticas).

Parece que Cohn está atualizando minha tese, pois ele está usando métodos de medição práticas e em breve travarei contato com ele via Dani Marino, uma amiga de Santos que faz parte do blog Quadro a Quadro - http://quadro-a-quadro.blog.br/ e que me ajudará na mediação, pois além do interesse dela nas HQs, seu conhecimento na língua inglesa é muito bom. 

  

Juliano: _Conheço o Quadro-a-Quadro... rs: sempre dou uma curtida nos quadrinhos que são postados pelo grupo no Facebook. Sim, me referia à leitura da literatura (estritamente: a escrita), professor, já que a literatura [escrita] é restrita apenas àqueles que entendem e decodificam o texto, e o idioma em questão. 

  

  

Prof.Dr. Gazy Andrausna verdade tanto a leitura de textos como a de quadrinhos habilita os leitores a se tornarem mais inteligentes, e ao se unirem ambas as modalidades, tal habilidade se eleva. Lembre-se que ao ler textos a mente é mais linear, racional, e ao ler desenhos, (HQs e ideogramas) a mente é menos linear. Mas nas duas há processo de cognição e criatividade, sendo que na leitura de desenhos é o hemisfério cerebral direito que se ativa mais ─ lê desenhos) e na escrita (fonemas) é o esquerdo, o que responde pela linguagem linear da leitura e escrita. E advirto também que o hemisfério esquerdo cerebral é atinente à lógica linear e racionalidade, enquanto que o direito é à não linearidade, e não racional (não dá nomes nem nada disso, que é tarefa do esquerdo. 

Por isso, ler HQs (e ver artes) produz uma mente mais inteligente no sentido de que aciona amplamente os dois hemisférios: um para ler textos e outro para ver/absorver desenhos, criando uma conjunção bem ampla na neurioplasticidade cerebral. Ah, e também, não quero dizer que quando o leitor vê só textos a mente direita se desativa, e nem quando ele "lê" somente desenhos, a esquerda se desative. Nada disso, ambas sempre funcionam juntas. 

O que quero dizer é que ativações de um lado podem ser maiores que o outro, dependendo dos impulsos (dos incentivos): se leio textos, meu cérebro esquerdo aciona mais áreas, embora o direito tb se acione; se leio desenhos, meu cérebro direito aciona mais áreas, embora o esquerdo também se acione. Como nos quadrinhos geralmente há textos, pode-se aferir que incentiva mais ainda o cérebro do leitor! Ou seja, ler HQs estimula uma alta de inteligência, contrariamente ao que se pensava décadas atrás: que quadrinhos fariam mal atrapalhando os estudos e a leitura! 

  

Juliano: 
Grato mais uma vez, professor!
Abraços!



  

Prof. Dr. Gazy Andraus é Coordenador e prof. do Curso de Pós-Graduação em Docência no Ensino Superior e criador da disciplina de HQ e Zine no curso de Tecnólogo em Design Gráfico da FIG-UNIMESP - Centro Universitário Metropolitano de São Paulo: R. Dr. Sólon Fernandes, 155, Vl. Rosália, CEP: 07072-080 - Guarulhos/SP. Tel: 11- 3544-0333- rm: 311 - gazy.andraus@fig.br; 


  

Ph.D. in Communication Sciences; Coordinator and teacher in Postgraduation at FIG-UNIMESP - http://www.fig.br/portal/curso.asp?codcur=7 

  

gazya@yahoo.com.br; 


Endereço pessoal (Address): Rua Jacob Emerick, 458, ap. 805, Centro, CEP:11310-070.


Nenhum comentário:

Postar um comentário